segunda-feira, 9 de maio de 2011

Banho de lua


Demorou, mas aqui está minha segunda postagem. A ideia era escrever algo completamente diferente do primeiro post. Mas eis que surge, mais uma vez, uma microalga para nos ajudar em alguma área que desafia a ciência. E novamente é uma daquelas espécies que normalmente não se dá muita atenção, simplesmente por ser muito comum.

Pois bem... Saber o que fazer com os resíduos radioativos que  contaminam o meio ambiente, é realmente um problema. A dificuldade consiste em conseguir selecionar e remover com eficiência o resíduo radioativo do meio. No caso do estrôncio-90*, a fitorremediação não consegue capturar o radioisótopo sem capturar junto uma quantidade muito maior de cálcio inofensivo, e resíduos nucleares contém cerca de dez bilhões de vezes mais cálcio do que estrôncio (Lovet, 2011).
A boa notícia é que em trabalho publicado recentemente na ChemSusChem, Minna R. Krejci e colaboradores, mostraram que a microalga Closterium moniliferum pode ser uma forte candidata para a fitorremediação de áreas contaminadas por estrôncio radioativo.
Imagem: Krejci et al. D. ChemSusChem doi:10.1002/cssc.201000448. 2011
C. moniliferum (fig. 1a) é uma microalga unicelular do grupo das desmídias. É conhecida  pelo seu formato de meia-lua e por tolerar ambientes com altas temperaturas, pH ácido, baixa disponibilidade de nutrientes e de luz. Além dessas características, esta microalga possui pequenos vacúolos terminais com cristais formados pela combinação de bário e/ou cálcio com sulfato, a barita (BaSO4) - fig. 1b. No entanto, o estrôncio é parecido com o cálcio e com o bário em propriedades e em tamanho, o que faz com que a microalga não consiga distingui-lo destes dois elementos e acaba capturando estrôncio numa quantidade muito maior do que de cálcio. Portanto, em ambientes com estrôncio, a microalga consegue capturá-lo, e parte do estrôncio do citoplasma acaba retido nos vacúolos e se cristaliza juntamente com o bário.

Para que a cristalização ocorra, é necessário a presença de bário e sulfato, e os experimentos mostram que as células precipitam os cristais num período de 30 minutos a uma hora. Porém, os testes ainda não foram realizados com material radioativo, sendo necessário averiguar se  C. moniliferum suporta exposição à radiação. Mesmo assim, elas são fortes candidatas à remoção de estrôncio radioativo por combinarem duas técnicas de biorremediação: fitoextração, devido ao material acumulado no seu citoplasma; e co-precipitação inorgânica, por sua capacidade de formar cristais. A vantagem da segunda técnica é que  a remoção definitiva do estrônio do meio pode ser feita ao  se recolher as microalgas e isolar os cristais por centrifugação ou incineração (fig. 1c). No entanto, é preciso averiguar também, que tipo de manipulação no meio é necessário para aumentar a eficiciência da técnica. Mas ao que tudo indica, um banho de lua, ou melhor, de meias-luas, faria bem não somente aos poetas da noite, como também, ao meio ambiente.

* O estrôncio-90 é um produto da fissão nuclear e é prejudicial à saúde. Por ser muito parecido em propriedades e em tamanho atômico com o cãlcio, pode se infiltrar em alimentos, sangue  e outros tecidos, podendo causar câncer.

ResearchBlogging.org


Referências:

Krejci, M., Finney , L., Vogt, S., & Joester, D. (2011). Selective Sequestration of Strontium in Desmid Green Algae by Biogenic Co-precipitation with Barite ChemSusChem, 4 (4), 470-473 DOI: 10.1002/cssc.201000448

Lovett, R. (2011). Algae holds promise for nuclear clean-up Nature DOI: 10.1038/news.2011.195

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